Ciência & Tecnologia

'Como ajudei a desmascarar um abusador online jogando Playstation'




Na mitologia nórdica, ogros – “trolls”, em inglês – costumam ficar embaixo de pontes, esperando o momento certo para atacar pedestres indefesos. Os “trolls” modernos, porém, se escondem usando avatares e perfis falsos nas mídias sociais para lançarem ataques verbais assustadores contra outros usuários.

O verbo “trollar”, bastante conhecido de quem usa internet, é uma adaptação da palavra inglesa “troll”. Ela significa provocar, ofender, zoar – tudo isso pela internet, em páginas, comentários de sites, redes sociais, etc.

E desse verbo surgiu o “troll”, a pessoa que comete as ofensas, os ataques e provocações a outra pela internet, em geral, usando um perfil falso.

O jornalista britânico Mike Deri Smith decidiu dar o troco aos trolls e passou a dedicar seu tempo para desmascará-los.

Ele já conseguiu rastrear dezenas de trolls ao redor do mundo. Começando pelo britânico John Nimmo, de 25 anos, que tinha como alvo ativistas feministas. Veja o seu depoimento:

“Depois do caso da Caroline Criado-Perez, a ativista (britânica) que fez campanha para conseguir colocar uma mulher em uma nota de £20, parecia que havia muita gente, em sua maioria, homens, que tinham problemas com isso.

Era fácil encontrar o ódio (a ela). Era só buscar no Twitter, tava cheio de coisas pesadas ali, ameaças de estupro, de que iriam descobrir onde ela morava e até matá-la.

Achei que poderia envolver essas pessoas em uma conversa e eventualmente questioná-las sobre os motivos que as levavam a fazer isso. Um dos homens que mais ofendia a mulher foi um dos que mais quis falar pelo Twitter. Parecia orgulhoso e feliz ao explicar suas razões. Isso porque eu me apresentei como jornalista.

Ele achou que a polícia nunca o encontraria. Disse que não tinha medo da polícia, que nunca seria pego. Essa frase depois foi lida no próprio julgamento dele.

Tentei, gradualmente, criar uma boa relação com ele, apesar de ser uma pessoa detestável, horrível. Tentei ser simpático e me mostrar interessado nas coisas que ele escrevia. Eu dizia ‘Lol’ (abreviação de ‘lough out loud’, ‘rindo alto’, comum em diálogos em inglês na internet) para todas as coisas que ele escrevia.

Queria ganhar a confiança dele para que ele me dissesse seu nome, onde morava ou qualquer coisa que me desse uma dica sobre quem ele era. Eu queria saber que tipo de pessoa posta esse tipo de abuso na internet.

Em determinado momento, veio a oportunidade de dizer ‘Bom, eu vou sair e jogar um pouco de PlayStation’. Pensei, ‘ele é jovem, provavelmente passa muito tempo jogando Call of Duty. Imediatamente, ele disse, ‘por favor, me adiciona no PlayStation. Podemos jogar’.

Nimmo tuitou ameaças para Carole Carole Criado-Perez (à direita), incluindo: ‘Vou achar você”

Foi essa bobeada – quando ele me deu seu nome de usuário no PlayStation, que ele também usava na sua página de Facebook – que permitiu que eu descobrisse quem ele era.

Olhando o perfil dele, não sei se poderia haver alguém com mais estereótipo de troll. Era jovem, um grande fã de videogames e , aparentemente, desempregado.

Fiquei impressionado. Era o tipo de pessoa que não despertaria medo em ninguém. E ainda assim, ele realmente assustou a mulher que estava trollandoele escreveu coisas pesadas – e acabou sendo preso por isso. Mas ver o perfil dele na internet me fez perceber como suas ameaças eram vazias.

Descobrimos onde ele morava. Falamos com o pai dele, que nos passou o número de telefone do filho.

No início, ele negou tudo, mas podíamos perceber pela voz dele que ele nunca pensou que o que estava fazendo na internet poderia passar para o mundo real, que todo aquele abuso terrível da parte dele poderia ter consequências.

A polícia prendeu ele dois dias depois. Ele ficou preso por oito semanas.

Depois disso, consegui rastrear e desmascarar vários outros trolls, que estavam cometendo abusos online ou promovendo o autodenominado ‘Estado Islâmico’.

Eu não me sinto orgulhoso por isso. Só sinto que essas pessoas deveriam assumir a responsabilidade por seus atos.

Todos eles são muito prepotentes e arrogantes online, mas no momento que você os confronta, eles rapidamente imploram para você não revelar quem eles são. Dizem que não tiveram a intenção de fazer ameaças e se mostram bastante amedrontados.

Quando você desmascara os trolls, você percebe que são figuras lamentáveis. Eles só querem provocar as vítimas. Não são nem como os adolescentes que cometem bullying no recreio. Não têm como machucar suas vítimas fisicamente.

Els sabem que disseram coisas horríveis. Eles desmontam. Se dão conta de que não são as pessoas que pretendem ser online. São pessoas fracas incapazes de sustentar o que dizem. Você percebe que eles não têm ideia do que é certo e errado online.

Os trolls têm de se dar conta de que a polícia descobrirá facilmente quem são. E a polícia está levando isso a sério.

Os trolls terão de considerar: ‘Será que eu quero perder meu emprego? Será que eu quero que esse abuso online venha à tona?”

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