Jornalistas franceses estão suspensos e podem perder o emprego após a participação em um grupo privado do Facebook que incentivava o assédio online de mulheres.
A existência da comunidade chamada Ligue du LOL foi revelada na semana passada pelo jornal francês Libération, que identificou funcionários no grupo. A maioria dos 30 membros eram homens.
Em um dos casos, um integrante fingiu ser um executivo de mídia e ligou para uma mulher oferecendo-a um emprego falso. A ligação foi gravada e compartilhada no grupo.
O escândalo foi comparado ao movimento #MeToo, que expôs delitos cometidos por homens poderosos contra mulheres. Alguns aspectos do caso também se assemelham ao assédio online por desenvolvedores de videogames durante o #Gamergate.
“Por seis anos, nos perguntamos se deveríamos falar em público [sobre os assédios]. Sabíamos que o que queríamos dizer não seria entendido”, disse a jornalista francesa Lea Lejeune para a revista de negócios Challenges.
Ela também escreveu sobre sua experiência no site Slate.fr. Segundo Lejeune, membros do Ligue du LOL escreviam insultos em seu blog feminista e sugeriam que ela havia dormido com seu chefe.
O Facebook ainda não confirmou se o grupo foi fechado ou se permanece ativo. O SOS Racisme, principal órgão anti-racismo da França, pediu que uma investigação preliminar fosse aberta.
Na mídia francesa, menos de um quarto dos 470 executivos do país são mulheres, segundo dados de 2018 divulgados recentemente.
Ligue du LOL
O Libération abriu uma investigação interna e suspendeu dois jornalistas que participaram do Ligue du LOL. Um deles, Vincent Glad, foi o responsável pela criação do grupo em 2009. Ele pediu desculpas e disse que a comunidade foi criada “apenas por diversão”.
Je vous dois des explications. Et surtout des excuses. pic.twitter.com/UajOC0bi0h
— Vincent Glad (@vincentglad) 10 de fevereiro de 2019
“Eu não percebi que, com as nossas piadas, silenciávamos as primeiras palavras feministas que apareciam nas redes sociais”, escreveu ele. “Eu criei um monstro que saiu do controle”, disse Glad, que é um freelancer regular do jornal.
Na segunda-feira, o Libération também publicou que o HuffPost France demitiu em dezembro três jornalistas que eram parte de um canal privado de discussões exclusivo para homens, chamado RBF. A sigla é referência às palavras rádio, cerveja e futebol. Comentários sexistas, racistas e homofóbicos eram comuns.
No mesmo dia, a revista semanal L’Express disse que a Vice France também afastou dois jornalistas em 2017 após um grupo de mensagens de natureza similar ser descoberto.
Já a revista de cultura Les Inrockuptibles afirmou que vai demitir seu editor David Doucet, responsável por ligar para uma jornalista com uma falsa proposta de emprego.
“Eu percebi que algumas pessoas eram alvos frequentes, mas não pensei na extensão do trauma que elas enfrentavam”, afirmou Doucet no Twitter. “Não há desculpas. Sinto muito”.
O editor chefe da revista Slate’s French, Christophe Carron, pediu desculpas por participar do grupo. “Se alguém se sentiu ofendido pelos meus comentários, ou se foram de mau gosto, eu sinto muito e peço sinceras desculpas”.
O diretor da revista, Marc Sillam, disse em pronunciamento que Carron era um membro passivo do grupo do Facebook e nunca “assediou nem insultou ninguém”. O editor manterá seu emprego.
Rumores sobre o grupo circulavam na mídia da França por anos.
Vítimas
As vítimas do grupo compartilharam suas experiências na internet. Capucine Piot, uma ex-jornalista, disse que foi alvo de uma montagem falsa de vídeo e acabou sendo atacada online repetidamente ao longo dos anos.
Ils nous ont humilié en place public, sans prendre la mesure de notre douleur, de ce qu’on pouvait ressentir. Là, c’était la descente aux enfers pour moi…
— capucine piot (@capucinepiot2) 8 de fevereiro de 2019
“Eles nos humilham em público, sem pensar na nossa dor, no que podemos sentir. Foi uma ida ao inferno para mim”, ela contou no Twitter.
A videojornalista Florence Porcel disse que ela foi uma das vítimas da oferta de emprego falso. Ela disse que “chorou de vergonha, humilhação e medo” quando a gravação se tornou pública.
A ativista Daria Marx escreveu em seu blog que por anos se sentiu “correndo de um atirador de elite” e escapando “das balas virtuais de um exército enlouquecido”.
Marlene Schiappa, ministra da França por equalidade de gênero, tweetou uma mensagem de apoio às vítimas na segunda-feira. “Toda a minha solidariedade para as jornalistas e blogueiras que sofreram o assédio sexista da #LigueDuLol. A internet não é cruel, ela é o que nós a tornamos”.
Tout mon soutien et ma solidarité aux blogueuses et journalistes qui ont eu à subir le harcèlement sexiste de la #LigueDuLol particulièrement @FlorencePorcel
Ce n’est pas « internet » qui est impitoyable, c’est ce qu’on en fait. https://t.co/SUbdSVHoxB— 🇫🇷 MarleneSchiappa (@MarleneSchiappa) 10 de fevereiro de 2019
Fonte: Canaltech