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As maiores fake news sobre vacinas contra COVID-19




As maiores fake news sobre vacinas contra COVID-19 - 1

Para o controle da pandemia da COVID-19, governos e pesquisadores apostam no desenvolvimento de uma vacina eficaz e segura contra o novo coronavírus (SARS-CoV-2). Com um imunizante pronto, centenas de milhares vidas poderão ser poupadas, a partir de campanhas de vacinação em massa. Pelo menos é esse o plano, mesmo que uma série de fake news tente implantar medo, contestando os benefícios desses medicamentos.

Com discussões tomando as redes sociais sobre o tema, foi observado um aumento de 383% em postagens com conteúdo falso ou distorcido sobre vacinas contra a COVID-19 no Brasil, dentro dos últimos dois meses. É o que aponta o último levantamento da União Pró-Vacina (UPVacina), grupo ligado à USP Ribeirão Preto.

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Nas redes sociais, nova leva de fake news exploram questões da vacina contra a COVID-19 (Imagem: Welcomia/Freepik)

Ainda sobre a desinformação nas redes, um estudo do Avaaz apontou que, entre 2019 e 2020, a desinformação ligada à saúde — publicada especificamente no Facebook — foi acessada 3,8 bilhões de vezes em cinco países (Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha e Itália).


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Para dimensionar a questão, esse “conteúdo” teve um alcance quatro vezes maior quando comparado ao desempenho das contas de dez grandes instituições de saúde, consideradas como fontes seguras, como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA.

Para evitar esses compartilhamentos, o Facebook, por exemplo, começou a adotar medidas, como sinalizações sobre a qualidade dos conteúdos e parcerias com agências de checagem de informação. Por causa dessas medidas, um grupo antivacina, neste mês, abriu um processo contra o Facebook e, especificamente, suas ações de fact-checking. E isso não é fake news.

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Nas redes sociais, circulam inúmeras fake news sobre a COVID-19 (Imagem: Fidel Forato/ Twitter)

Uma das grandes dificuldades para definir se as notícias se tratam de fake news ou não é que parte significativa desses compartilhamentos mistura informações reais com afirmações falsas e imprecisas sobre o tema. Em outras palavras, as fake news sobre a COVID-19 se sofisticaram e, assim, encontram um maior alcance e conseguem manipular mais a informação. Se agora os boatos giram em torno do imunizante, vale lembrar que, ainda na pandemia, muita notícia falsa já rodou por aí, inclusive ensinando receitas bizarras, como consumir água sanitária para combater a COVID-19.

Bill Gates e os implantes de microchips

No universo das fake news, uma das associações mais populares é entre a COVID-19 e Bill Gates, atual filantropo e fundador da Microsoft. Através da Fundação Bill e Melinda Gates, ele estaria envolvido em um plano que originou a pandemia da COVID-19 e essa tragédia seria aproveitada para implantar microchips na população mundial. Por usa vez, cada microchip permitiria o controle externo de pessoas com antenas 5G.

Esses boatos começaram a surgir ainda em março, quando o empresário afirmou que “teremos alguns certificados digitais” ​​para mostrar quem já se recuperou de um caso da COVID-19, foi testado ou recebeu a vacina, sem nenhuma menção a microchips e a tecnologia 5G. A ideia era criar uma espécie de passaporte para quem já tivesse se recuperado da infecção.

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Bill Gates é alvo de fake news sobre vacina contra a COVID-19 (Imagem: Reprodução/Twitter)

A partir disso, textos sobre como Gates planejava implantar microchips para combater o coronavírus começaram a ser compartilhados, de forma viral, nas redes sociais. Junto de afirmações sobre a COVID-19, os criadores de fake news resgataram um projeto da Fundação que planejava utilizar uma “tinta invisível”, que pode ser aplicada na pele, e que funcionaria como um registro de vacinação.

Veja bem: nunca existiram afirmações sobre um microchip que seria implementado em humanos e, sim, uma tinta especial. Além disso, a tecnologia original dessa espécie de “tatuagem” não permitiria o rastreamento de pessoas e nem inclusão de informações em banco de dados para vigilância.

“Gates é um alvo frequente destes rumores, porque, através de sua fundação, ele financia muitas instituições de saúde e científicas. Especificamente em relação à COVID-19, ele deu uma palestra há alguns anos, falando que havia um grande risco da humanidade enfrentar uma pandemia“, explica João Henrique Rafael Júnior, do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto. Isso foi um prato cheio para os conspiracionistas.

Kanye West e a marca da besta

Em uma polêmica entrevista para a Forbes, o rapper norte-americano Kanye West endossou fake news envolvendo Bill Gates e as potenciais vacinas contra a COVID-19. “Eles querem colocar chips dentro da gente, querem fazer todo tipo de coisa, para fazer com que não possamos atravessar os portões do céu”, declarou o cantor.

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Fake news tenta relacionar a vacina contra a COVID-19 com a marca da besta (Imagem: Fidel Forato/Canaltech)

Entretanto, West adicionou um novo elemento para as teorias conspiratórias sobre o imunizante, afirmando que ele seria considerado como “a marca da besta”. Fato curioso é que mais usuários enxergam as potenciais vacinas contra a COVID-19 de alguma forma ligadas ao satanismo e a essa dita marca da besta.

Mesmo que algumas correntes possam interpretar uma vacina de modo negativo perante determinada religião, não há evidência de que os milhares de pesquisadores, de diferentes culturas e credos, e os inúmeros institutos públicos, espalhados por todo o mundo, tenham envolvimento formal com qualquer seita que seja.

Entre os católicos, o Papa Francisco não só defende a vacinação, quando houver uma vacina segura e eficaz, como questiona sua distribuição. “Seria triste se a prioridade da vacina da COVID-19 fosse dada aos mais ricos. Seria triste se isso se transformasse na prioridade de uma nação e não fosse destinado a todos”, afirmou o pontífice.

Vacina não usa fetos e nem tumores

Outra fake news que circula com bastante alcance entre as redes sociais afirma que as vacinas, em desenvolvimento, contra a COVID-19 trazem em sua fórmula ou utilizaram células de fetos abortados e tumores. Aqui, é preciso entender primeiro como é feita a produção de vacinas, já que diferentes imunizantes podem ser produzidos de diversas formas.

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Fake news podem afetar imunização contra a COVID-19 (Imagem: Fidel Forato/Canaltech)

Como parte das vacinas utilizam cópias inativadas (mortas) ou atenuadas (alteradas para não causarem infecção) de um vírus, os cientistas precisam replicar milhões desses vírus em alguma célula para, então, produzirem o imunizante. Por exemplo, a história dos fetos foi relacionada com a vacina CoronaVac, desenvolvida pela empresa chinesa Sinovac e com testes em andamento no Brasil com coordenação do Instituto Butantan.

Nesse caso, a história não faz nenhum sentido. “As células usadas para replicar os coronavírus são as células Vero. São um tipo de célula bem específica, que vem do epitélio do rim de um macaco (Cercopithecus aethiops). São usadas dessa forma, porque têm uma caraterística bastante específica de desenvolvimento, de replicação. Também são células que não entram em morte celular após um tempo”, explica o Infectologista do hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo e doutorando pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), João Prats, para o Canaltech.

É verdade que outras culturas celulares podem ter se desenvolvido a partir de tecidos embrionários. No entanto, não se usam fetos nesse processo e, sim, células que vierem de um tecido coletado há mais de 40 anos. Desde então, o tecido deu origem a outras gerações, somente, replicadas in vitro — e é esse material que pode ser usado na produção de um agente infeccioso, mas não está dentro de vacinas.

Danos irreversíveis ao DNA

Posts nas redes sociais apontam que vacinas contra a COVID-19, especificamente aquelas que usam um RNA mensageiro (mRNA), poderiam causar “danos irreversíveis” ao DNA das pessoas vacinadas. De acordo a fake news, um imunizante capaz de produzir essa mudança seria a fórmula da farmacêutica norte-americana Pfizer, desenvolvida em parceria com a empresa de biotecnologia alemã BioNTech.

Nesse tipo de vacina, uma sequência de RNA mensageiro é introduzida na pessoa, pela vacina, e faz com que as células do organismo construam uma proteína específica do vírus. Uma vez produzida dentro do corpo, o sistema imunológico pode reconhecê-la como um antígeno e criar imunidade contra o verdadeiro coronavírus. Dessa forma, quando o vírus entrar no organismo, a pessoa já terá anticorpos prontos.

“Biologicamente, não tem evidência nenhuma disso [alteração do DNA]. No caso das vacinas de mRNA, tudo é transparente, tudo é publicado. Os dados estão aí para serem analisados. E um cara que faz uma alegação dessas basicamente não leu a literatura. É muito importante explicar para as pessoas que isso é impossível”, defende Cristina Bonorino, professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (Ufcspa) e membro do comitê científico da Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI).

Morte de cientista e casos de gripe

Sim, é uma infinidade de fake news que tomam conta das redes sociais, e selecionamos as mais absurdas para compor esta lista. Por exemplo, uma notícia falsa também afirmou que a cientista Elisa Granato, uma das primeiras pessoas a ser imunizada com a vacina da Universidade de Oxford, em abril, teria falecido após a vacinação. Quando a suposta morte começou a ser divulgada, a cientista precisou confirmar o fato de estar viva e saudável.

Se não bastassem as histórias criadas para atacar a vacinação contra a COVID-19, boatos tentam evitar outras vacinações. É o caso de posts alegando que a vacina contra a gripe poderia aumentar as chances de complicação por causa do coronavírus. “Não existem estudos correlacionando vacinação para influenza e risco de adoecimento ou complicações por COVID-19”, explicou o Ministério da Saúde, em comunicado.

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Campanhas de desinformação criam fake news sobre vacinas contra a COVID-19 (Imagem: Dimitri Houtteman/Unsplash)

Afinal, por que vacinas são seguras?

Teorias da conspiração podem causar estragos graves nos sistemas de saúde, ainda mais quando se fala da COVID-19, uma doença que já levou ao óbito mais de 850 mil pessoas em todo o planeta. Somente no Brasil, são mais de 120 mil mortes pela infecção causada pelo coronavírus. Nesse cenário, uma vacina eficaz e segura é o objetivo de milhares de pesquisadores, médicos, cientistas e autoridades públicas. Mesmo que seja tão desejada, não se pode pular etapas no seu (cuidadoso) processo de aprovação e é por isso que são tão importantes todos os ensaios clínicos das vacinas.

Para a liberação de um novo imunizante, são necessários: a publicação de estudos que detalham a capacidade de proteção contra um agente infeccioso e os possíveis efeitos colaterais; autorizações de diferentes órgãos públicos (no caso do Brasil, a Anvisa); e milhares de testes em diferentes grupos de pessoas. É por isso que vacinas são seguras para o uso humano e, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), evitam entre duas milhões e três milhões de mortes por ano.

Cheque antes de compartilhar

Antes de compartilhar uma informação sobre vacinas contra a COVID-19 ou qualquer outra doença, é preciso entender a responsabilidade que se tem sobre esse conteúdo e sua capacidade de influenciar pessoas do seu círculo virtual, mesmo como usuário. Por isso, vale se perguntar se uma informação pode ser verdadeira ou não.

Para tirar dúvidas, é possível acompanhar perfis oficiais de saúde nas redes sociais, como o do Ministério da Saúde. Outras fontes seguras são os materiais divulgados por institutos, considerados como referências no controle e acompanhamento do coronavírus. Nacionalmente, são eles: Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro; Instituto Adolfo Lutz e o Butantan, ambos em São Paulo.

Também vale consultar sites de fact-checking, ou seja, páginas que verificam se determinada notícia (nacional ou internacional) é real, de maneira rápida, como a Agência Lupa. Para isso, um grupo de mais de 100 checadores de informação, distribuídos por 45 países, falantes de 15 línguas, concentram suas descobertas em uma lista no Twitter que pode ser acessada aqui.

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Fonte: Canaltech

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