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Crítica | Uma Aventura Lego 2: uma descomprometida volta da vitória




Há cinco anos, Uma Aventura LEGO chegava aos cinemas. A magia criada pelos roteiristas e diretores Phil Lord e Christopher Miller (de Anjos da Lei e Anjos da Lei 2, 2012 e 2014) encantou a maior parte do público e da crítica. Investindo na ludicidade, essa primeira parte é tanto nostálgica quanto instigante, percorrendo um caminho livre e cheio de liberdade. Melhor ainda: Em sua revelação final, transforma o cinema em um universo mais próximo, em uma ferramenta para acreditar que jamais se deve perder a infância – que as crianças são o único futuro possível para um mundo desgastado.

Cuidado! Daqui em diante esta crítica pode conter spoilers.

Só pode ser fantasmas ou alienígenas

Como tudo foi incrível em 2014, há uma tentativa de resgatar, em Uma Aventura Lego 2, muito do que deu certo antes. Assim, Lord e Miller retornam como roteiristas e demonstram uma clara empolgação com o resultado que obtiveram há meia década. Por outro lado, eles buscam um caminho que, além de ser reflexo de uma investida que deu muito certo, é recheado por situações experimentadas em outras produções. Se isso não chega a contaminar cada situação com uma sensação de déjà-vu, talvez ceda um gosto requentado.

(Imagem: Warner Bros. Pictures)

Nesse sentido, pode ser interessante perceber o quanto a continuação perde desde a sua idealização: sem poder repetir o plot twist mais bonito do primeiro, Uma Aventura Lego 2 parece se encantar por um caminho inverso. Isso fica minimamente claro quando a infância de Finn (Jadon Sand, do excelente Brick Madness) é substituída por sua entrada na adolescência e, junto à essa metamorfose, a figura infantil de sua irmã Bianca (Brooklynn Prince, de Projeto Flórida) começa a tomar conta – de forma rasa o suficiente para não ter as atitudes compreendidas de fato. É problemática, por exemplo, a reação da pequena Bianca quando seus personagens recebem, logo no início, um coração – uma espécie de rendição, de pedido de paz –, agindo com uma negação que nem mesmo é verbal. Essa fisicalidade surge gratuitamente, em uma tentativa de fundamentar um grupo de vilões que, lá no fundo, poderia ter dimensões fantásticas por ser criação de quem é, e é justificada pela facilidade do desconhecido: Em um apelo clichê àquilo que não se tem conhecimento ou que pouca necessidade tem de se ter extraída qualquer explicação, o desconhecido só pode ser fantasmas ou, no caso, alienígenas.

O poder de ser criança

Mike Mitchell (de Trolls, 2016) assume a direção dessa sequência tentando, a todo custo, reacender as chamas do antecessor. Dessa maneira, enquanto o roteiro parece mais uma descomprometida volta da vitória de Lord e Miller (em comemoração ao sucesso anterior), Mitchell faz o possível para que o filme seja relevante. E até tem sucesso: Risadas são praticamente inevitáveis e a construção de emoções por meio do timing é quase infalível. A casa dos sonhos erguida por Emmet Brickowski (originalmente dublado por Chris Pratt, o Star-Lord da equipe dos Guardiões da Galáxia – e consequentemente dos Vingadores) para sua amada Lucy (Elizabeth Banks, a Rita Repulsa de Power Rangers) é das passagens mais sensíveis não somente do filme em questão, mas englobando a sua primeira parte. É como se ela simbolizasse a paz tão desejada por almas atormentadas.

Lucy, por sinal, sempre com os pés fincados no chão, nunca desiste de calibrar a personalidade de Emmet para algo que se aproxime mais do mundo pós-apocalíptico da fase que antecede a idade adulta – um mundo inteiro que referencia Mad Max: Estrada da Fúria (de George Miller, 2015), inclusive com Lucy sendo uma espécie de Imperatriz Furiosa (papel de Charlize Theron no filme de Miller). Enquanto o protagonista insiste que tudo é incrível, sua companheira busca o equilíbrio, contornando as confusões dele com a nova (e nem tão original) percepção de que nem tudo é incrível.

(Imagem: Warner Bros. Pictures)

E é nesse tormento que reside o ponto mais delicado do filme: a adolescência e toda a sua desordem de hormônios sendo consumida pelos alienígenas da infância. Se, por um lado, a visão esteja invertida – já que é a adolescência que consome e toma o lugar da infância –, por outro, Finn é quem se vê ameaçado, tendo a sua infância subtraída e, ainda, percebendo que a irmã continuará detendo o poder de ser justamente uma criança.

Mas, nesse pequeno tratado que pode remeter ao processo comum de ciúme entre irmãos, o roteiro é, no final das contas, confuso o suficiente para que Bianca possa ser vista quase como uma monstra destruidora, a verdadeira vilã comedora de corações. E, se ao final, surge um simbolismo que tenta trazer uma reviravolta para o conflito, esse vem como um contorno bem menos complexo do que sua referência imediata: Toy Story 3 (de Lee Unkrich, 2010). É como, infelizmente, desconstruir algo extremamente bem sedimentado no primeiro filme. A narrativa, antes embasada para que se pudesse crer na criatividade das crianças, cai em uma metalinguagem autodepreciativa que pode ser triste: Nem tudo é incrível e, nisso, encaixa-se, agora, o entusiasmo do final de cinco anos atrás, praticamente escorrido pelo ralo aqui.

Cinema ou campanha publicitária?

Um Aventura Lego 2 acaba por não levar em conta que um final tão bem arquitetado não poderia ser simplesmente substituído por uma campanha (por sinal, linda) claramente promocional. Sem dúvida, a intenção de revelar que irmãos podem brincar juntos, ressaltando a união, e construir personagens e tudo o mais – híbridos ou não – é expressiva o suficiente para emocionar, portanto, é uma pena que a impressão em primeiro plano seja de propaganda da marca.

(Imagem: Warner Bros. Pictures)

O fato de uma das músicas afirmar que ficará presa dentro da cabeça de quem a escuta sugere, meio que de um jeito camuflado, um ato publicitário, como um jingle. Dessa forma (e por tudo dito – e provavelmente mais), a animação afunda-se em si mesma, atestando de maneira muito vulgar que as vendas dos brinquedos estão acima (ou, no mínimo, lado a lado) de sua empreitada no cinema. E isso é uma pena para uma produção que é sequência do excelente Uma Aventura Lego, a predecessora que trouxe o excepcional spin-off LEGO Batman: O Filme (de Chris McKay, 2017).

Fonte: Canaltech

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