Ciência & Tecnologia

Jovens tentam acertar apresentação antes do TED no Rio




Na manhã de segunda-feira (6), no hotel Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, foi dado início ao TED Global, uma das conferências mais populares do mundo e que é realizada no Brasil de forma inédita. Mas, para a engenheira florestal brasileira Patricia Medici, que participava pela primeira vez do evento, a conferência havia começado muito tempo antes, na busca pela apresentação perfeita.

“O treinamento que recebemos para dar essa palestra é surreal”, disse a conservacionista após sua palestra à BBC Brasil. “Assistimos a seminários online sobre cada aspecto da apresentação, o design de slides, como contar uma história, uma infinidade de coisas.”

Ela e mais dois outros brasileiros fazem parte da turma do programa TED Fellows, que reúne jovens inovadores de mais de 80 países e dá a eles a possibilidade apresentar suas ideias sob o holofote de possíveis apoiadores presentes na conferência.

Esta oportunidade foi dada na segunda-feira a 20 desses “fellows”, que se apresentaram antes do início da parte principal do TED Global – que inclui os principais palestrantes – que começa nesta terça-feira e vai até o dia 10 de outubro (confira a programação).

Para estes jovens, o desafio foi aprender como apresentar seus projetos no formato único do evento, que já foi alvo de pesquisas. No caso deles, isso consiste em resumir sua proposta em apenas quatro minutos, em inglês.

Presença de palco e imagens
O TED nasceu em 1984 com a proposta de conectar pessoas com projetos e ideias inovadoras de design e tecnologia. Nomes como Steve Jobs, Bill Gates, Stephen Hawking e, mais recentemente, o economista francês Thomas Piketty já participaram do evento.

Desde então, as conferências do TED se tornaram populares em todo o mundo ao serem colocadas na íntegra na internet, onde podem ser vistas gratuitamente.Os clipes online normalmente acumulam centenas de milhares de visualizações. Assim, o evento se tornou uma vitrine mundial para ideias transformadoras.

Uma das sugestões recebidas pelos fellows durante a preparação foi fazer apresentações com mais imagens do que texto, o que segundo Medici fez uma grande diferença para mostrar o trabalho ao qual se dedica desde 1996, a Iniciativa Nacional para a Conservação da Anta Brasileira.

“As pessoas se conectam mais com fotos”, disse ela. “Também aprendemos a melhorar nossa presença de palco com técnicas de respiração e postura, como fincar os dedos dos pés no chão e projetar o peito. Dá mais confiança.”

Medici foi recomendada para o programa por seu esforço para tornar a anta mais conhecida até entre os próprios brasileiros.

“Fazemos muita pesquisa para tecer estratégias de conservação para este bicho. Mas, mesmo que você publique artigos e capítulos de livros, o público continua não sabendo o que é uma anta. A sensação é de pregar para convertidos”, disse.

“Queremos que os brasileiros conheçam o animal e as ameaças que ele sofre, mas também desenvolver um senso de orgulho, como nos orgulhamos de outras espécies. É o maior mamífero terrestre do Brasil, mas falamos dele apenas como sinônimo de pessoa burra.”

Desafio
A bióloga molecular e computacional Marcela Uliano da Silva, de 27 anos, também teve a oportunidade de se apresentar na conferência na segunda-feira. Seu desafio era despertar o interesse da plateia sobre um trabalho complexo: o sequenciamento do genoma de um molusco, o mexilhão dourado.

O molusco foi introduzido no Brasil via Argentina nos anos 1990 e se reproduziu rapidamente e em grande quantidade, alterando ecossistemas no sul do país. Uliano acredita que descobrir os mecanismos genéticos da sobrevivência do animal é a melhor maneira de evitar que sua proliferação cause estragos nos rios da bacia Amazônia – de onde, segundo seu monitoramento, ele está perigosamente próximo.

Ao se preparar para apresentar seu projeto no TED, a bióloga brasileira acredita que ter tido a chance de ver um lado novo do seu próprio trabalho.

“O que é mais importante no TED é gerar um impacto coletivo e apresentar um modelo que pode ser aplicado em outros assuntos”, diz ela. “Já confiava no meu projeto, mas passei a entendê-lo de modo diferente ao apresentá-lo desta forma. Popularizar a ciência é obrigação do cientista.”

Após acabar apresentação, Uliano revelou uma preocupação de sua preparação no dia anterior:

“No ensaio, falei muito rápido. Hoje consegui fazer mais pausas. Você conseguiu entender bem?”

Missão cumprida
Perto das duas cientistas brasileiras, o grafiteiro Thiago Mundano pode ser considerado um veterano do TED. Antes de se convidado para ser um fellow, ele já havia participado no Brasil de dois eventos TEDx, conferências menores e regionais organizadas de maneira independente, mas ligadas ao TED original, para falar seu projeto “Pimp my carroça”, que oferece assistência e apoio a catadores de lixo em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Curitiba.

Nem por isso subir no palco principal do TED foi simples.

“Foi difícil mesmo assim, porque só tinha quatro minutos e era em inglês. Para passar a mensagem que queria, tive que cortar muita coisa”, afirmou Mundano.

“Gostava das conferências do TED, mas não conhecia esse universo dos fellows. É uma oportunidade de fazer com que um projeto ganhe força, inspire outras pessoas. A gente quer é perder o controle mesmo.”

Mundano disse que, por causa de compromissos, ele se preparou pouco para o evento e não aproveitou tanto quanto gostaria os seminários dados aos fellows.

“Cheguei aqui ainda muito envolvido com as eleições. Meu ensaio ontem foi um desastre”, admitiu. “Mas tive depois um dia para ganhar mais confiança.”

Sua palestra acabou aplaudida de pé por alguns dos presentes, e ele foi elogiado pelos colegas.

“Vi que deixei as pessoas com a pulga atrás da orelha. Saio daqui com a missão cumprida.”

Preço salgado
Apesar de disponibilizar as palestras na internet após a conferência, o TED Global não é exatamente um evento acessível. Poucas pessoas podem estar na plateia. É preciso pagar US$ 6 mil para estar lá.

E, no ano que vem, ficará ainda mais caro. Para assistir ao TED 2015, em Vancouver, no Canadá, será preciso desembolsar US$ 8,5 mil.

Segundo os organizadores, os preços altos funcionam como uma “curadoria” de pessoas interessadas nas ideias – e que também podem vir a ser possíveis financiadoras dos projetos.

“No treinamento, disseram que deveríamos ‘estudar’ os participantes, identificar os que queríamos conhecer e tentar fazer contatos com eles”, diz Medici.

“Devemos estar abertos, sem sentir a obrigação de conseguir financiamentos. Vim com esse espírito, mas, depois da minha conferência, três filantropos já entraram em contato comigo. Vamos ver no que vai dar.”

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