A Banda A Olívia lançou no final do mês passado “Cadê o Fogo”, segunda faixa do EP “Input” que estará disponível ainda nesse mês de agosto. A faixa chega acompanhada de videoclipe. A música traz uma mistura de referências filosóficas e poéticas e relaciona a origem do universo com a ausência de propósito, em consequência do consumo exacerbado.
“Cadê o Fogo” também manifesta uma tentativa de provocar a “chama eterna” em cada um. A inspiração para a letra veio, dentre tantas coisas, de uma declaração do Papa Francisco. Confira a entrevista respondida pelo vocalista Luis Vidal!
‘Uma banda de rock alternativo regado à poesia e tragicomédia’, o que seria tragicomédia? Por onde tiram inspiração para transformar as músicas em tragicomédia?
Nós não costumamos só chorar ou só rir. Esse sentimento não é 100% em nenhuma situação. Pra mim, é uma questão de intervalo do acontecimento. Talvez na hora de uma tragédia, por exemplo, não tenha nada de bom para tirar daquilo, você está tão imerso que apenas sente o baque. Mas, depois de horas, dias ou séculos, olhando por uma perspectiva diferente, de vez em quando a gente esbarra nas coincidências da vida e abre um sorriso gostoso. A comédia é um jeito mais libertador de encarar a vida. A tragédia são os fatos difíceis de conviver, como um rio que cheira a esgoto e passa por dezenas de bairros, inclusive os mais nobres, por exemplo. Acho que a inspiração para transformar músicas em coisas tristes e felizes ao mesmo tempo, vêm daquilo que acreditamos, a indefinição de gostar ou deixar de gostar. Na minha visão, o que une as pessoas do mundo todo é um enredo tragicômico da humanidade. Quando o Lulu Santos diz “assim caminha a humanidade com passos de formiga e sem vontade” é tragicômico. Quando o Ailton Krenak fala que a “humanidade está se deslocando de forma absoluta do organismo vivo que é a terra” aí, neste caso, seria só tragédia mesmo.
‘Output’ foi gravado durante a pandemia e ‘Input’, um EP oposto é lançado após a pandemia. Pode-se dizer que em 2 anos o estilo da banda mudou?
Mudou. Literalmente, inclusive. Tivemos trocas de integrantes, então a sonoridade do baixo, por exemplo, já havia mudado com a entrada do Pedro Tiepolo e hoje com o Marcelo Rosado na guitarra solo. Temos outro tipo de som ao vivo. Em relação às músicas, de Output para Input a diferença de produção é muito grande, porque Output fizemos tudo em home studio e com produção quase 100% online. Input foi gravado em estúdio, com muitos equipamentos analógicos e o som acaba ficando mais orgânico. Fizemos a pré-produção toda de Input ainda na pandemia, então, voltar a gravar e a tocar depois disso tudo é muito libertador. O nosso estilo atual é muito mais irreverente, pra cima, meio maluco, mais divertido. Nos últimos shows que fizemos foi até engraçado, porque parece que essa formação já toca a muito tempo e, na verdade, não fizemos nem 5 shows com essa nova estrutura.
Lançado no final do último mês, o single “Cadê o Fogo” promove uma grande mistura de referências filosóficas e poéticas que relaciona a origem do universo com a ausência de um propósito, em consequência de um consumo exacerbado. Como foi a história do processo de criação dessa música e porque da escolha da temática? O que os inspiraram a fazer essa música?
A primeira inspiração foi o Cazuza. Ele sempre começava as músicas com umas frases bem marcantes. Queríamos tentar fazer algo parecido, então eu tinha essa frase “No princípio era verbo até que a verba acabou” que pra mim era uma frase que me impactava pela força das ideias opostas. Eu estudei em colégio católico na primeira infância, fiz catequese e crisma. Então, sempre tive essa coisa de questionar a minha fé ou o que essas pessoas me diziam. Na faculdade de comunicação eu estudei um pouco mais sobre filosofia e os clássicos, aí pra mim ficou claro que algumas questões não têm respostas. Eu saí escrevendo a letra da música de uma forma meio intuitiva pra tentar questionar porque essa frase significava tanto pra mim, e a conclusão que cheguei era que pouco me importava no que eu acreditava ou não, mas sim o que me incomodava de verdade: a ganância, o dinheiro e a sede pelo poder. A teoria por trás da música talvez seja a humanidade se aproveitar tanto das boas pessoas e das ideias mais puras apenas para lucrar, que não restou mais uma base sólida. E embora a gente tenha esse desejo natural de fazer grandes coisas, existe um esforço externo para que essa chama fique bem pequenininha e contida.
Com uma pegada bastante provocativa, a música realça a chama eterna que existe em cada um de nós e apresenta o planeta como algo dominado e moldado pelos homens. Vocês diriam que essa música funcionaria como uma crítica social?
Sim, ela funciona como uma crítica com certeza, mas funciona também como uma autorreflexão do tipo: no que eu acredito, por que eu acredito e quem quer que eu acredite. Talvez, exista um conjunto de entidades, empresas e pessoas poderosas me obrigando sutilmente a acreditar num número limitado de possibilidades. Talvez eu devesse acreditar mais em mim! Porque eu posso ser bom no que eu quiser, afinal, existe uma chama, uma alma ou pelo menos uma vontadezinha que habita em mim.
A respeito da música, o seu estilo traz um arranjo bastante festivo e com uma pegada brasileira mais apaixonante, vocês adicionam bastante elementos de rock, tais como guitarras e uma craviola, que é um instrumento brasileiro de cordas. Sendo assim, como definiriam a Banda A Olivia em questão de estilo musical?
Somos uma banda brasileira que faz rock brasileiro e pop rock. Dá pra dizer que somos alternativos e indie também, mas isso fica um pouco no meio do caminho. Levamos algumas bandas dos anos 80 como referência, dentre elas: Paralamas, Titãs e Barão. Ainda assim, curtimos rock internacional desde os anos 70 até 2000.
Além do lançamento da música nas plataformas de streaming, vocês também apresentaram um videoclipe oficial que já está disponível no YouTube. Como foi o processo de produção do vídeo?
Nosso desejo era fazer um vídeo de estúdio, que não fosse nem uma simulação de gravação, nem um clipe de bastidores. Algo que passasse mais o mood da banda dentro de uma produção artística, seja gravando ou ensaiando, fazendo videoclipe ou criando uma música nova. A ideia da gente ficar trocando de instrumento, por exemplo, foi uma brincadeira do que muitas vezes acontece quando estamos ensaiando em casa e não no estúdio. Vira uma zoeira e cada um sai tentando tocar o instrumento que não está acostumado. Vou confessar que dá um pouco de raiva, porque o Pedro Tiepolo consegue tocar todos muito bem.
A respeito da união de você como grupo, poderiam nos contar um pouco mais sobre como se deu a formação da banda e o que esperam poder transmitir para o público através dos seus trabalhos?
Eu toco com o Murilo desde a primeira formação que era feita por um par de amigos. Tinham dois amigos de um lado e dois amigos do outro, que um dia se encontraram e formaram uma banda. Daí chamamos o Pedro Lauletta, que era um amigo meu, para tocar teclado. Durante a pandemia tivemos a saída do baixista e do guitarrista. Agora com o Pedro Tiepolo e com o Marcelo esperamos transmitir a sensação de “novidade”. Porque são duas pessoas que acabaram de chegar, com muita vontade e visões diferentes. Dois caras que são apaixonados por música, gostam de escrever e produzir também. Quando você começa a trabalhar com pessoas novas, é impossível não abrir a sua mente. Esperamos trazer essa ideia de expansão para o público. Expandir os horizontes, as possibilidades, abrir a cabeça, botar o coração na ponta da chuteira. Não dá pra ignorar que estamos saindo de uma pandemia. Não foi pouca coisa. Se isso não mexer com a gente, o que mais pode mexer? A vida é muito curta pra gente não dar o nosso máximo.
Antecedendo o lançamento do novo EP, vocês fizeram ainda esse ano o lançamento de “Olhei pra Dentro”, como observaram o avanço de vocês entre um projeto e outro?
A gente renasceu. Tamo com outra pegada, outro vigor. Olhei Pra Dentro foi uma música que entrou nas nossas mentes e um dos arranjos que mais demoramos para fazer. Já fizemos três shows com ela no set, e ela tem um lance que é trazer a vibe mais pra baixo. Não no sentido deprê, mas de diminuir a energia mesmo. Porque a gente estava mais contido, precisamos estar. Os anos mais intensos de pandemia foram os mesmos de mudanças que aconteceram na banda. Agora, com o lançamento de “Cadê o Fogo”, já começamos a botar as asinhas de fora e assim que o EP sair vamos quebrar tudo. Duas músicas no EP são muito simbólicas nesse sentido: “You Better Leave” e “Beija meu Pescoço”. A primeira é uma grande metáfora e fala sobre mudar de estação e deixar o trem partir. Já a segunda tem um nome bem sugestivo, mas fala sobre se entregar ao amor e sentir prazer pela vida. Hoje eu me sinto mais realizado e sei que a banda tem mais prazer em fazer o que faz.
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Com Andrezza Barros e Regina Soares
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Fonte: Observatório dos Famosos